Já admirava o trabalho do músico nascido em Itú (SP) e erradicado na Capital Paulista, não só pela dedicação, habilidade e entusiasmo com que invariavelmente dedilha as teclas brancas e pretas, mas, principalmente, pela franqueza da sua alma artística. A música de Schanoski é inspirada e ao mesmo tempo sincera, e sua vocação musical é nítida, lapidada com muito estudo. Não fiquei surpreso ao saber que foi eleito pelos leitores da Revista Roadie Crew em 2018 e 2019, sem contar outras diversas indicações, como um dos melhores tecladistas brasileiros, juntamente com outros grandes artistas, como Fabio Laguna (Edu Falaschi), Juninho Carelli (Anie), Rafale Agostino (Armored Dawn), Fabio Ribeiro (Viper/Remove Silence). Sua trajetória iniciou cedo com estudos de piano erudito aos noves anos de idade, e já com quatorze anos começou a lecionar música, auxiliando o pai a custear seus estudos, daí para frente, antes mesmo dos dezoito anos iniciou a vida profissional, incluindo trabalhos com composições em sua imensa lista de atividades.
Conheci pessoalmente Mateus Schanoski no ano de 2015, mais especificamente na área de check in localizada no porto de Santos, no litoral de São Paulo. Ambos aguardávamos autorização para embarque no navio Zenith, para o cruzeiro temático "Motorcycle Rock Cruise". Eu estava ali com a banda Echoes Pink Floyd São Paulo, e Schanoski com a banda Last Rebel - Tributo ao Lynyrd Skynyrd. Esse evento contou também com participação das bandas Angra, Sepultura, PHILM, Kiara Rocks, e Plebe Rude, além de tributos como Rolling Stones Cover Brasil e Classical Queen, dentre outros. Lembro-me bem de passarmos uma tarde conversando no deck principal do navio, em um sábado, e enquanto consumíamos algumas garrafas de cerveja, falamos sobre sintetizadores, emuladores de hammond, pianos, canções, solos, síntese sonora, enfim, uma boa e típica conversa de dois tecladistas. Como ele me revelou posteriormente, foi nesse festival que conheceu Kadu Pelegrini (Kiara Rocks) e Bruno Luiz (Electric Funeral - A Black Sabbath Tribute), originando convite deles para gravação de duas músicas no EP 555 da banda StormSons que haviam criado, e, após algum tempo, outro, mas dessa vez para que integrasse a banda definitivamente como quinto membro. Disse-me Schanoski: "eu amei as músicas logo que ouvi".
Na última noite no Navio Zenith, ocorreu algo que posso descrever como a mais fantástica confraternização entre músicos que já participei: mais precisamente no lounge do café, o que começou com dois ou três músicos solitários cantando clássicos do rock com um violão, logo se tornou um evento que ensejou por reunir grande parte dos músicos do cruzeiro, que chegavam de todas as partes, pelos elevadores, escadas e corredores, e logo o salão se tornou um imenso coral acompanhado apenas pelo som daquele violão e também pelo (som) de um piano de cauda felizmente presente, onde se revezavam Schanoski, Renato Zanuto (Sepultura) e eu. Era a despedida não oficial do barquinho do rock, como carinhosamente apelidamos o Zenith. Em dado momento, Schanoski olhou para mim enquanto acompanhava no piano a massa sonora a cantar "Hey Jude" dos Beatles, e disse uma frase que jamais saiu da minha cabeça: "Renato, o barquinho na verdade é uma grande festa dos músicos. A gente se diverte mais do que os passageiros".
Mês passado liguei para o tecladista e perguntei se estaria disposto a me conceder uma entrevista, que foi gentilmente aceita.
Quando despertou seu interesse pela música?
Sempre gostei de música, que é a minha lembrança mais antiga. Os discos de jazz e clássicos dos meus pais, os discos de prog e MPB da minha irmã... Lembro que gostava muito de todos os instrumentos musicais e os desenhava num caderno. Sabia o nome de todos com uns cinco anos. Queria tocar mas não sabia qual instrumento, gostava de todos. Aí vi um Maestro na TV dizendo que o piano era o instrumento mais completo que existia e de maior tessitura, assim, iniciei meus estudos de piano clássico aos nove anos. A educação musical faz parte de toda a minha família. Meus irmãos, tios e primos, muitos estudaram piano, aliás, um tio e um primo foram músicos profissionais em Itú, onde nasci. Vim pra Sampa com minha Família quando tinha dois anos, e iniciei meus estudos aqui com nove anos de idade. Na adolescência, queria apenas tocar, estudar e evoluir. Nessa época, estudei piano erudito no Conservatório Bandeirantes e teclado e programação com Fábio Ribeiro. Fazia todos os workshops e masterclass que eu conseguia. Atualmente voltei a estudar piano erudito e também chorinho.
Daí naturalmente surgiram as bandas de rock?
Passei por muitas bandas, atualmente sou tecladista da StormSons, Blues na Floresta para crianças, Lomo Plateado do Willy Verdaguer, além de sideman do Golpe de Estado.
Sobre o Golpe de Estado, foi uma surpresa receber um convite?
Lógico! os atuais integrantes me procuraram dizendo que queriam voltar com o Golpe e comemorar os trinta anos de carreira, e então gravei o dvd e o cd ao vivo. Na verdade nunca imaginei que poderia tocar com eles, e nem mesmo ser considerado um dos melhores tecladistas de rock no Brasil pelos leitores da Revista Roadie Crew desde 2012. Sou indicado quase todos os anos. Nunca imaginei onde chegaria. Estar na mesma lista que mestres era uma coisa que nunca poderia imaginar.
Sobre a StormSons, o primeiro álbum homônimo foi lançado em 2019. Alguma novidade por aí?
Ano passado aproveitamos para compor e gravar músicas para o próximo álbum que será lançado ainda este ano, além do single com clip "Heavens Envy", lançado em março. Acabamos de lançar uma versão de "Beauty and The Beast" com Isa Salles, também com clip. Os próximos lançamentos que ainda acontecerão neste primeiro semestre ainda não posso revelar.
Como ocorre o processo de gravação com a StormSons?
É simples: todos da banda tem seu home studio. Cada um grava sua parte em casa. O baixista Henrique Canale é nosso Produtor. Enviamos todo o material para ele, que, assim, mixa e masteriza. Meu processo de criação ocorre praticamente depois que tudo já está gravado. Teclados são o chantilly do bolo. Na StormSons tenho liberdade de fazer o que eu quiser e misturar estilos diferentes. Quando a música é mais pesada, uso hammond e synth pesado para dobrar os riffs. Camas, efeitos eletrônicos são feitos depois. Crio todos os timbres pra StormSons, não uso presets. É tudo exclusivo para a banda. Sempre arriscamos, utilizamos sempre que possível elementos de teclados que não são comuns no metal. Na mesma música pode ter solo de hammond e introdução com church organ. Gostamos muito de usar samples de corais masculinos bem graves, até mesmo fora da tessitura humana, para conferir ar bem sombrio, assim como corais de crianças em momentos mais leves. Usamos também timbres de bateria eletrônica e synths arpegiando com mudança de filtros como na música eletrônica, e é possível escutar tudo isso em todas as plataformas digitais. Para o single "Heavens Envy", inserimos orquestração com violinos e cellos de verdade. As músicas novas que serão lançadas este ano estão tomando outro rumo, meio que uma mistura dos timbres anos 1980 com outros mais modernos do Vsynth. A StormSons está conseguindo criar uma personalizada musical. Muita coisa, tudo misturado, mas respeitando a música que fizemos. Não é forçar a barra pra mostrar que estamos misturando tudo apenas pra mostrar que é diferente, apenas cuidando para respeitar a canção com personalidade. Tem muitos elementos eletrônicos que fazemos após tudo estar gravado, quase um remix da Música pronta mas somente em alguns momentos. Tentamos sempre sair do tradicional. A banda toda dá pitaco nos arranjos de teclado, praticamente todos juntos criamos os arranjos de teclados após a gravação da base principal. Penso também no meu silêncio, e nas partes muito pesadas nem toco. Acho importante o silêncio das teclas também.
Está claro que sua vertente musical é o rock, não é mesmo?
Sim, mas estudei música erudita e jazz também. Amo música brasileira e latina. Toco e estudo de tudo em casa. Gosto de tocar música negra em geral: blues, jazz, soul e grooves... o rock é negro também.
Vc se inspira em alguém em especial?
Sempre amei Jon Lord, Chuck Leavell e Eddie Harsh. No Brasil César Camargo e Lafayette.
Vamos falar um pouco sobre equipamentos? quais seus prediletos?
Em geral prefiro marcas européias. Acho o punch deles bem mais pesado. Mas todas as marcas praticamente tem um modelo que todos nós somos apaixonados. Agora na quarentena, por não poder fazer mais shows de blues, adquiri um sonho que é o Roland V Synth GT. Gosto de vintages, mas não acho tão necessário fazer shows com eles, porque complica a logística e encarece demais o show. Um simulador faz o papel muito bem. Se for fazer uma gravação em vídeo ao vivo, clip, ou lançamento de disco, vale a pena usá-los, mesmo em concertos especiais.
Síntese aditiva, subtrativa, FM ou sample?
Gosto de todas, cada uma com sua própria magia, mas FM é bem chato de programar, embora o Yamaha Dx7 pra mim, até hoje, seja um grande teclado.
Uma lista dos equipamentos que já utilizou...
Na época que comecei a usar instrumentos mais profissionais, optei por usar um controlador e vários módulos juntos. Era um Kawai que tinha quatro midis independentes. Aí podia misturar todas as marcas e sons e aumentar muito a polifonia, que na época era complicado. Meu primeiro workstation foi um Korg N364. Depois passei a amar meus Oberheim Ob3 e MC1000, e, na sequência meu último e melhor workstation que já tive: o Yamaha Motif Es7. Até hoje acho o melhor Motif que já existiu. Bom, na sequência parti para os Nords. Mas já tive de tudo. Roland W30 e Korg Poly 800 são dois modelos inesquecíveis! Agora na quarentena, me desfiz da minha escola e estou trabalhando em casa remotamente. Tinha muito equipamento que tive que me desfazer por falta de espaço. Montei um home studio e dou aulas remotas e faço gravações. Fiz um Hackintosh, interface Presonus, gravo no Cubase e tá tudo plugado: Nord Stage 3 76hp; Nord Lead 2x; Casio PXS 3000; Roland V Synth GT; Tokai Tx Combo; Voltix; Theremy; Behringer Modelo D. Utilizo suportes da Saty, Hack Staff Drum e KeyProStand 360 nos shows, além de monitores Edifier e fones Numark e AKG. Dois instrumentos atualmente que estou estudando e gostando muito são a Escaleta Hammond 44, e o Roland V Acordion Fr5, aliás, prefiro a sanfona digital pra poder estudar com fone de ouvido, pois moro em apartamento.
Como funciona seu setup em termos de conectividade, o bom e velho sistema MIDI, USB, ou ambos?
Tá tudo plugado e misturado. Gravo meus áudios em midi tbm.
Forme um setup de teclados com no máximo seis.
Tudo Nord! Grand Piano, C2D, G2, Lead 2x, Stage 3 e Wave 2.
Qual o melhor conselho que já recebeu?
Seja verdadeiro no seu trabalho com a música. Não toque só por dinheiro.
Se você pudesse mudar alguma coisa em sua vida musical, o que seria?
Não mudaria nada. Sei que errei bastante, mas isso me ajudou muito a evoluir. Talvez eu pudesse ter estudado mais.
O que vem a seguir?
Ainda não posso revelar. Logo que a quarentena acabar, todos irão saber.
Algum interesse em seu tempo livre, além da música?
Sou Cinéfilo! Amo cinema! e consumo muita cultura em geral, como artes plásticas, danças e documentários, além de filmes estrangeiros e nacionais. Sou completamente viciado em arte. Atualmente leio livros de neurociência ligados a música. Adoro filosofia e astronomia também.
Cite alguns momentos musicais.
Piano de Kenny Kirkland em "Bring on the Night", do Sting ao vivo, no álbum homônimo, melhor solo da música pop até hoje; "A Whiter Shade of Pale" do Procum Harum; Cesar Camargo Mariano com Elis Regina no Ensaio da TV Cultura, e também ao vivo em Montreux; Jimmy Smith em "I Got My Mojo Working"; a música mais linda do Universo, que é "Song for You", de Leon Russel e interpretada por Ray Charles; além de "Time", de Alan Parsons Project.
Que conselho vc poderia dar para quem pretende iniciar os primeiros passos no mundo da música?
Aproveite esse início para se dedicar ao máximo fazendo a sua música. Quanto mais se dedicar no início da sua carreira, mais rápido terá reconhecimento e retorno financeiro. Faça música boa e seja verdadeiro, que tudo dará certo.
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